Terça, 19 de Agosto de 2025
Em mais de 50 anos, o hip hop transcendeu as periferias e se estabeleceu como força dominante na cultura global. Segundo o pesquisador Spensy Pimentel, a maioria dos artistas que produzem hits atualmente são rappers.
Apesar da popularidade, o movimento mantém a essência de contestação de suas origens.
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“O rap e o hip hop continuam sendo um canal de expressão para lutas ao redor do mundo”, comenta Pimentel, citando o surgimento de grupos de rap indígena no Brasil.
Pimentel destaca o Brô Mc's, grupo guarani-kaiowá de Mato Grosso do Sul, formado em 2009. Ele explica que o grupo se identificava com a realidade das favelas, expressa nas letras dos Racionais Mc's.
A proximidade entre as realidades se manifesta nos problemas enfrentados: “As reservas indígenas superlotadas e próximas da cidade padecem de problemas urbanos, como violência, alto índice de suicídios e insegurança alimentar”.
O Livro Vermelho do Hip-Hop, originalmente o trabalho de conclusão de curso de Pimentel na USP, foi relançado. A obra, de 1997, baseava-se em entrevistas com expoentes do movimento em São Paulo, Rio de Janeiro, Recife e Brasília. Inicialmente, o autor distribuiu cópias aos entrevistados. A Revista Caros Amigos fez um especial sobre a pesquisa em 1998, e o portal Bocada Forte disponibilizou uma versão digital em 1999.
A nova versão, em publicação conjunta das editoras Glac e Autonomia Literária, foi lançada durante a Festa Literária Pirata das Editoras Independentes (Flipei), em São Paulo.
Segundo o autor, a edição atualiza o trabalho original, mostrando como o hip hop continua a expressar as lutas atuais. O relançamento também visa manter viva a memória do movimento. “Tem esse sentido de tentar buscar algo com essas novas gerações, para que rememorem as raízes do movimento e percebam que essas raízes estão muito conectadas com os movimentos de luta pela descolonização”, afirma.
A cultura hip hop foi influenciada pela organização dos Panteras Negras. O título do livro faz referência a uma cena do filme de Melvin Van Peebles, em 1995, em que membros do movimento vendem o livro de citações de Mao Tsé-Tung para arrecadar fundos.
Os Panteras Negras defendiam a população negra contra a violência policial e atuavam em diversas frentes comunitárias. O Livro Vermelho do Hip-Hop também apresenta figuras importantes das lutas por direitos civis nos EUA, como Martin Luther King e Malcom X, contextualizando suas histórias com filmes e documentários.
Na época do lançamento original, Pimentel buscava preencher uma lacuna na produção intelectual sobre o hip hop.
“Ele acabou sendo um documento que apoiou, em muitos lugares, as iniciativas que buscaram fazer com que o poder público reconhecesse o hip hop como expressão cultural válida, merecedora de apoio”, diz sobre a importância da publicação.
O rap no Brasil estava em plena efervescência e em busca de um público maior. Sobrevivendo no Inferno, dos Racionais Mc's, foi lançado em 1997 e, desde 2020, o livro com as letras do disco é leitura obrigatória no vestibular da Unicamp. “Depois, vieram muitos estudos [sobre hip hop] e hoje, com certeza, mais trabalhos de vários autores, ainda mais com a inclusão que foi ocorrendo na universidade nos últimos 20 anos”.